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QUINTA-FEIRA



Quinta-feira era um dia especial para mim, significava trabalho, eu e meu vizinho, um amigo de infância que infelizmente fui perdendo a afinidade com o passar dos anos, e hoje no máximo dizemos um ‘oi’ ou ‘bom dia’, quando eventualmente nos esbarramos na rua, ou quando convergimos em retirar os carros das garagens na mesma hora ao sairmos para trabalhar de manhã cedo.


Estudávamos à tarde, e nas quintas de manhã cedo, o que acordava primeiro batia na porta da casa do outro para acordá-lo para o ‘trabalho’, éramos apenas crianças, mas cumpríamos com rigidez a rotina e o horário.


Pegávamos um carrinho de mão emprestado com algum vizinho que nos emprestava de bom grado e subíamos duas ruas para o ‘quadradão’ na entrada da Vila Roriz, onde até hoje ocorre uma feira a céu aberto, onde os moradores das redondezas compram frutas, verduras, legumes, temperos e boa parte das coisas que uma feira pode oferecer.


Na época era bem maior do que é hoje, ia do estacionamento da Escola Classe 28 até o muro da igreja evangélica, com uma grande quantidade barracas, tendas e carros. Lembrei desse detalhe um dia desses ao caminhar por lá e observar que hoje ocupa apenas um terço do que já foi.


Eu e meu vizinho, que se chama Bruno, estacionávamos ao lado do ônibus da CEASA e esperávamos as pessoas aparecerem com suas várias sacolas pesadas, aí oferecíamos o nosso serviço, que consistia em transportar as compras das pessoas até suas casas, prestávamos um serviço de frete, que não era caro e era calculado com base na distância que teríamos que percorrer até a residência do cliente, se fosse perto, cobrávamos R$ 0,50, nem perto e nem longe R$ 1,00, longe R$ 1,50, e longe pra caralho R$ 2,00.


Não costumávamos incluir o peso nos custos, de modo que vez ou outra transportávamos cargas pesadas por longas distâncias, ainda bem que dividíamos o ônus de transportar, cada um levava um pouco, às vezes usávamos os postes de iluminação para medir a distância que cada um teria que levar as compras.


A maioria de nossos clientes eram senhoras, e nunca fomos mais longe do que 2 km, tínhamos concorrentes, outros garotos como nós, mas nunca deu briga, a regra era que o frete era de quem o cliente escolhesse.

Os mais velhos achavam graça naqueles dois garotos trabalhando tão cedo, ao invés de estarem assistindo desenho em suas casas, e íamos conversando no caminho, algumas vezes nos pagavam mais que o combinado e ainda davam alguma fruta para voltarmos comendo até a feira.


Na volta revezávamos, um ia descansando no carrinho, enquanto o outro empurrava, e assim fazíamos até meio dia, quando o expediente se encerrava e devíamos voltar para casa, tomar um banho e ir para a escola, antes disso, sentávamos em alguma calçada, calculávamos quanto havíamos faturado, dividíamos igualmente e gastávamos com balas, doces e lanches.


Devolvíamos o carrinho de mão ao vizinho, não esquecendo de agradecer e na quinta-feira seguinte começávamos tudo de novo.


Crônicas Gamenses - Histórias de uma cidade que ama



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